You Idiot

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muito diferente, no entanto, é a relevância do contributo de cada um para o debate. a liberdade de falar não garante a entrada em qualquer conversa. e algumas duram há séculos. o jogo do que


conta para a discussão é felizmente mais complexo e exigente. o anónimo pastor evangélico terry jones descarregou um vídeo no youtube em que prometia queimar o alcorão no dia 11 de


setembro. a imprensa chamou a atenção para o vídeo, hillary clinton entrou publicamente em pânico, barack obama falou preocupado sobre o tema e o pastor adormeceu na sua casinha em


gainesville, na florida, convencido de que a sua opinião importava para a longa conversa sobre fundamentalismo. dizer disparates no youtube não é sequer um candidato a contributo para o


debate. é, por isso, preocupante que a comunicação social tenha dado tanta atenção ao caso. por causa da confusão útil entre liberdade de expressão e mérito, o pastor passou de curiosidade a


acontecimento. terry jones é livre de queimar os livros que quiser. precisamente porque não conta. HÁ MUITOS ANOS À ESPERA jeremy warner, editor do jornal telegraph e um dos comentadores


mais influentes na grã-bretanha sobre assuntos económicos, escreve um artigo oportuno sobre o que separa os estudantes universitários ocidentais, em particular os britânicos, dos chineses.


uma fotografia em que vemos os pais dos caloiros a dormir no ginásio da universidade da província de wuhan inspirou o autor, que explica a importância da educação para este povo. vindos das


terras mais remotas do país, os pais acompanhavam os filhos no dia crucial da inscrição na faculdade. segundo jeremy warner, o ritual não seria de todo compreendido em inglaterra. os


próprios alunos britânicos nem sequer assistem à cerimónia de formatura. mas os números indicam que os chineses anseiam por ter cada vez mais conhecimento. o número de doutorados em


engenharia é três vezes maior na china que nos estados unidos, e as inscrições na universidade de novos e antigos alunos quintuplicaram entre 1998 e 2005. a notícia não me surpreende. há


cerca de oito anos, na biblioteca de pequim, quase não conseguia andar por causa das raparigas e dos rapazes que liam de cócoras nos corredores. eram milhares. serão milhares de milhões.


CONFIANÇA TRAÍDA porque é que um pedófilo que seja padre, médico ou professor é uma criatura mais vil aos olhos de muitos que outro que comete o mesmo crime e é apresentador de televisão,


actor ou cozinheiro? porque os laços de confiança quebrados pelos primeiros não existem no caso dos segundos. os crimes são cometidos por pessoas, que por sua vez não vivem desligadas da


sociedade. se um pedófilo é alguém que exerce uma profissão que merece a confiança da comunidade, é o autor, além do crime cometido, que causa repulsa. entender que um apresentador de


televisão tem a mesma responsabilidade social que um médico é desculpabilizar aquele em quem os pais confiam para examinar os seus filhos no consultório. o abuso do cargo nem sempre implica


desvio de fundos, mas tem sempre que ver com a quebra de laços de confiança. por isso os crimes de pedofilia na família são tão graves e têm de ser denunciados. porque o crime é cometido num


ambiente que se toma por tranquilo e seguro. sugiro a seguinte distinção: apresentadores de televisão pedófilos são criminosos. médicos pedófilos são criminosos que se aproveitaram do seu


cargo para cometer o crime. é diferente. é pior. CLOONEY SABE naomi campbell, em entrevista ao _new york times_, comentou a mais recente aparição de angelina jolie numa iniciativa de


solidariedade com as vítimas das cheias no paquistão. diz a alegada destinatária dos diamantes de charles taylor que angelina jolie faz muito bem em fazer o que faz mas que a caridade


realizada para os olhos dos outros não lhe interessa. a crítica de campbell até parece acertada. fazer o bem pela calada é a melhor maneira de o praticar. mas nem sempre é desejável.


angelina jolie pode actuar como uma anónima que decide dar dinheiro a pessoas com necessidades básicas, mas pode também ir mais longe e usar a sua posição privilegiada para chamar a atenção


para um problema grave. no entanto, julgo que percebo a irritação de naomi campbell. talvez tenha visto um filme mau chamado beyond borders, em que a personagem de angelina se dedicava a


confortar os refugiados. nos sítios de maior miséria, jolie estava sempre impecavelmente maquilhada, vestida e penteada, a contrariar um verso de ‘the lady is a tramp’: «won’t go to harlem


in ermine and pearls». os olhos maquilhados no paquistão lembraram que nestes casos é sempre melhor que vá o george clooney. A ROUPA É QUE ESCOLHE u ma senhora em campo de ourique esperava


que o semáforo para os peões mudasse para verde. estava vestida com um macacão cai-cai de tecido leopardo e ligeirinho. reparei no tecido por causa do padrão e porque havia uma brisa que o


fazia mexer. dias mais tarde, perto do areeiro, vi uma rapariga alta e magra com um vestido de alcinhas finas e saia aos folhos com o mesmo motivo leopardoso. desta vez reparei nos sapatos –


e peço desculpa por isso. eram brancos. sem fixar a minha atenção em nenhuma das mulheres, fiquei com a impressão de que nem o macacão nem os folhos favoreciam as suas figuras, embora o


vestido fosse mais pavoroso que o dito fato completo mas cai-cai. das duas vezes fiquei a pensar que o leopardo não é para todos, mas incerta sobre o que me levava a matutar no tema, visto


que o mesmo podia ser dito sobre a maior parte do vestuário: as minissaias não são para todos, as calças justinhas não são para todos ou as calças largas não são para todos. após longas


horas de reflexão, concluí que o problema está no que o padrão exige. uma camisa leopardona não é uma camisa azul. tem de ser linda. e um padrão que requer beleza não pode ser assim tão mau.